Natação poderia parecer uma disputa monótona, vista da arquibancada em provas de pouca “emoção” como os 200 ou 400m (qualquer estilo). Provas curtas geram curtas e intensas emoções; provas longas, quase nenhuma. A verdade é que, à exceção dos revezamentos, se de um lado o espectador poderia não ver tanto dinamismo numa competição, por outro lado os atletas ali dentro da piscina põem em xeque sua estratégia arquitetada desde os últimos treinamentos.
Sim, atletas que se prezem arquitetam por assim dizer, sua estratégia de prova bem antes da competição. E os mais “inteligentes” bolam os típicos planos A e B (se uma estratégia não der certo, a outra dará). Isso é típico de atletas de resistência e fundo, que nadam acima dos 200 metros. Mas os velocistas (50 e 100m) não escapam de planejar sua conquista, utilizando o que têm de melhor a partir do fundamento da largada – saída. Para um velocista: de que adianta desenvolver velocidade em 45 metros, se nos últimos 05 metros ele perde no toque final? (vai arranjar alguma desculpa?)
Em provas do tipo maratonas aquáticas com distâncias de 05, 10 ou até 25 km é notável a necessidade de utilizar e aplicar uma estratégia para o melhor aproveitamento e conquista da vitória. Recentemente, as provas transmitidas dos últimos campeonatos mundiais de maratonas aquáticas têm conferido grandes emoções em verdadeiras disputas, inimagináveis para quem quer vencer no toque. Talvez um atleta faça média de 01’04 a cada 100m nos 10km, talvez seu adversário faça 01’07 a cada 100m... e como ambos chegam juntos para disputar no toque? Estratégia.
Para efeito de experiência própria e considerando um relativo conhecimento teórico, exponho aqui as estratégias de ataque e defesa que os atletas profissionais adotam durante uma prova, principalmente acima dos 200 metros/jardas – são quatro:
· Começar na frente
· Sprint de meio
· Perseguição
· Finalização
Essas estratégias poderão ser melhores detalhadas noutra matéria, mas todas têm seu inverso quando consideramos ataque ou defesa, em relação ao seu adversário, ou seja, se você adotar uma dessas estratégias, atente para o inverso que seu adversário poderá reagir durante a prova.
Michael Phelps foi tri-campeão olímpico e atual recordista mundial no 100m Borboleta. Em duas de suas memoráveis disputas para conquistar o ouro, adotou a estratégia de perseguição, sabendo que seu corpo foi treinado para resistir ao máximo à produção de ácido lácteo no final da prova. E assim venceu em 2008 e 2012, virando os primeiros 50m bem atrás de seus adversários, mas resistindo melhor que eles no final para manter velocidade e assim tocar primeiro.
O grande ícone de natação em que se tornou se manteve nessa única estratégia de perseguição em suas principais conquistas memoráveis, porém acabou esquecendo que um adversário seu adotaria a estratégia contrária e assim o venceria nas olimpíadas do Rio 2016. Joseph Schooling não era só um novato em olimpíadas e com certeza não apostou na sorte para vencer simplesmente o Michael Phelps. Ele sabia que Phelps tinha uma estratégia que não mudava há muito tempo – tornou-se previsível. E assim, não só passou na frente nos primeiros 50m, como soube atacar através do sprint de meio – quando Phelps pensou em reagir no final da prova, era tarde, teve que se contentar com a prata.
Em provas de fundo, as estratégias ficam melhor visíveis. O australiano Grant Hackett foi bi-campeão olímpico e tetra-campeão mundial seguido no 1500m Livre – de 1998 a 2005, os outros atletas disputaram a prata ou bronze porque o ouro já tinha dono. Hackett adotou a mesma estratégia de começar na frente em três jogos olímpicos: Sidney 2000, Atenas 2004 e Pequim 2008. E por que em Pequim 2008, perdeu o ouro por apenas 69 centésimos? Estratégia de Oussama Mellouli. O tunisiano entrou com o 08º tempo da final e fez valer a máxima bíblica: “Os últimos serão os primeiros”. Ele perseguiu Hackett do início ao fim da prova, quando nos últimos 150m imprimiu um sprint, passou de Hackett nos 1400, manteve o ritmo e disparou nos últimos 50 metros. Hackett ainda tentou um sprint final, mas sua estratégia estava mais que previsível e assim se contentou com a prata.
Quando os atletas adotam uma estratégia, o perigo é se acostumar com ela. Tem atletas que sempre reagiram numa prova de um mesmo jeito, qualquer que seja sua classificação final, ou seja, sempre apostou na sorte para vencer. Vencer é bom, chegar na frente traz uma satisfação enorme. Mas não se sinta com o orgulho ferido quando seu adversário descobriu isso antes de você e tocou na frente. Tornar-se previsível pode ser sua pior estratégia, por mais que você passe meses treinando até mais forte que seu adversário.
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